MP investiga banco clandestino de óvulos e espermatozóides na clínica de Roger Abdelmassih
SÃO PAULO - O Ministério Público abriu um segundo inquérito para investigar Roger Abdelmassih, de 65 anos. A suspeita é de que o médico mantinha em sua clínica, nos Jardins, em São Paulo, um banco clandestino de óvulos e espermatozóides. Os promotores vão investigar se ele adotava práticas ilegais de fertilização. Neste domingo, o engenheiro químico Paulo Henrique Ferraz Bastos afirmou em entrevista ao "Fantástico" ter colaborado por mais de dois anos com Abdelmassih e fez acusações ao médico.
Abdelmassih deve ser transferido para um presídio no interior de São Paulo. Ele responde por 56 estupros e atentado violento ao pudor . Outras cinco pacientes devem depor contra o médico. A defesa dele entrou com pedido de liberdade no Supremo Tribunal Federal, depois de ter recursos negados na Justiça paulista e no Superior Tribunal de Justiça.
Segundo Ferraz Bastos, a empresa da qual era sócio fazia pesquisas genéticas com animais, mas passou a trabalhar também com fertilidade humana quando foi contratada pelo médico.
- Me incomodava bastante o fato de uma parte das pesquisas da minha empresa veterinária ter sido deslocada para uma clínica de humanos. Quer dizer, culturas de células animais sendo trabalhadas em uma clínica humana - diz.
O engenheiro diz que tinha acesso aos laboratórios da clínica, mas achava que muita coisa ali estava errada.
- Existem pesquisas na clínica do doutor Roger que são escandalosas. Por isso, eu fui contra e briguei com eles, por uma questão ética - diz.
De acordo com o depoimento de uma paciente à polícia, o doutor Roger chegou a propor embriões compatíveis com as suas características físicas da paciente e do marido, do mesmo tipo sanguíneo. A mulher perguntou de quem seria o embrião. E ele respondeu, já impaciente, que isso era com ele, já que era a "parte médica". Ele teria dito que todas as pessoas na clínica eram de "alto nível" e não seria nenhum embrião de nenhuma "neguinha de rua"
Depois de uma tentativa fracassada de engravidar, outra ex-paciente diz ter recebido do médico uma proposta. A sugestão era usar o óvulo doado por uma outra mulher, sem contar para o marido dela.
- "Era para pegar um óvulo doado. Disse que eu não precisava contar para o meu marido. Ele falou que iria fotografar uma pessoa e me mostrar, para pegar um DNA muito próximo. Ele disse 'A criança nasce e nem você vai acreditar' - relata a mulher.
Outra prática polêmica é a transferência de citoplasma. Funciona assim: pega-se um óvulo fértil, geralmente de uma mulher mais jovem, e se retira o citoplasma, uma espécie de gel que fica dentro da célula e tem varias estruturas, que fazem o óvulo funcionar. O citoplasma é injetado no óvulo da paciente com dificuldade pra engravidar.
- Palavras dele: 'Você turbina o seu óvulo com parte do citoplasma do óvulo de uma mulher mais nova. A chance de nascer com DNA de outra mulher seria mínima" - denuncia uma paciente.
A técnica foi proibida nos Estados Unidos em 2001. No Brasil, a resolução do Conselho Federal de Medicina, de 1992, não menciona a transferência de citoplasma, pois ela só seria desenvolvida quatro anos depois. O texto estabelece que deve haver sigilo sobre a identidade dos doadores de óvulos, espermatozóides e pré-embriões e que é sempre necessária a aprovação do cônjuge ou companheiro para um tratamento de reprodução assistida.
- Os indivíduos provenientes dessa tecnologia são potencialmente de três pais genéticos - explica o médico Jorge Hallak.
O engenheiro Ferraz Bastos disse que as práticas são possíveis e poderiam ser feitas na clínica.
- Seria possível fazer realmente na clinica do médico. A tecnologia existe e está à disposição. Do meu ponto de vista, é altamente antiético, mas é possível - comenta o engenheiro, que diz ter sido ameaçado.
- Recebi e-mails que falavam que aqui no Brasil é muito fácil ser assassinado.
Há ainda denúncias sobre uso de reprodução assistida com determinação do sexo da criança.
- Eu perguntei para ele se era possível escolher menina. Ele me falou que sim. Ele simplesmente falou que isso teria um 'custozinho' a mais e disse que ia fazer por US$ 1,2 mil - conta uma dona-de-casa.
Segundo o Conselho Federal de Medicina, as técnicas de reprodução assistida não devem ser aplicadas para selecionar o sexo do bebê, a chamada sexagem.
O médico teve negado dois pedidos de liberdade - pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e pelo Superior Tribunal de Justiça. A defesa vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal.
- Todos os procedimentos feitos com as pacientes eram com a assinatura das partes envolvidas. A defesa vai demonstrar de maneira clara, taxativa e transparente a inocência do doutor Roger - afirma José Luís de Oliveira Lima, advogado do especialista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário