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sábado, 15 de agosto de 2009

WOODSTOCK PARTE 2


Momento cheio de lama e pessoas desgrenhadas de incrédula beleza

Durante Woodstock, o reino hippie simultaneamente atingiu seu público máximo e se abriu para a imitação e a trivialização – mais uma centelha de rebeldia reduzida a uma declaração de estilo.

Para aqueles que acreditam verdadeiramente, Woodstock girou em torno da cooperação e da ajuda mútua, do fazer amor, e não guerra (em uma época na qual o Vietnã havia dividido a América em águias e pombos, o pássaro pousado na guitarra no logo do festival era uma pomba da paz). Porém, Woodstock foi também um monte de gente ficando chapada em um concerto de rock, o que era bem mais fácil do que trabalhar para mudar o mundo.

Ativistas políticos como Abbie Hoffman, amplamente conhecido por cunhar a frase Woodstock Nation (Nação Woodstock), quis alegar que o festival era um símbolo de resistência à repressão. Pete Townshend, porém, colocou Hoffman para fora do palco quando este interrompeu a apresentação do The Who para protestar contra a prisão por porte de drogas do companheiro ativista John Sinclair.

Havia um fervor antiguerra em algumas canções, como em “Handsome Johnny” de Richie Havens e “I-Feel-Like-I’m –Fixin’-To-Die Rag”, de McDonald’s. Joan Baez falou sobre seu marido, preso por se recusar a se alistar, e cantou “We Shall Overcome”. Aquela aura particular dos anos 60 de uma predestinação iminente de iluminação estava presente em várias canções, como em “Wooden Ships” (cantada tanto por Jefferson Airplane quanto por Crosby, Stills, Nash and Young) e em “Amazing Journey”, do The Who. Teve também Jimi Hendrix tocando “Star-Spangled Banner”, com seus gritos ao fundo e seus glissandos nervosos e insistentemente americanos. Woodstock, porém, não foi um fervoroso comício, teve também canções de amor, blues e extensos solos de guitarra.

Mercado Woodstock

Depois que passou o burburinho, a aura comunal utópica da Nação Woodstock deu lugar, quase que imediatamente, à realidade do Mercado Woodstock: Um grupo demográfico como alvo à beira de ter seus sonhos arrancados de seu propósito radical e transformados em mercadorias. Um público maior percebeu que era possível apreciar música, drogas e diversão sem as armadilhas ideológicas.

Rapidamente todo mundo tinha virado meio hippie: cabelos compridos para os homens não mais sinalizava o que eles acreditavam. A rádio FM, fonte de informações do rock underground da época, trocou DJs experimentais por formatos mais consistentes, nos quais os anunciantes poderiam se apoiar. Agora que a importância do público tinha ficado clara – de que o mesmo não era formado por apenas meia dúzia de malucos – profissionais voltaram a tomar o comando.

Pôster original: 3 dias de paz e músic



















Woodstock e outros festivais do final dos anos 60 mudaram as proporções dos festivais de rock. Bandas logo deixaram os teatros e passaram a se apresentar em estádios: uma semana antes de Woodstock, por exemplo, Joe Cocker e a banda Jefferson Airplane dividiram um cachê no Fillmore East, que contava com 2.700 assentos. A música logo se expandiu e estourou, enchendo arenas recém conquistadas. O início dos anos 70 foi a era de noddling jams e dos solos de bateria de 10 minutos de duração, alguns anos mais tarde metralhados pelo punk-rock.

Grandes concentrações de público vieram depois do Woodstock. Um público estimado de 600 mil pessoas compareceu ao Festival da Ilha de Wight, em 1970, e ao Summer Jam realizado Watkins Glen, estado de Nova York, em 1973. Estes, porém, foram meros concertos, não símbolos culturais. Apropriadamente ou não, Woodstock ainda é invocado em descrições de festivais mais recentes, apesar destes serem consideravelmente menores, mais organizados e mais confortáveis. Nenhum deles tolera penetras.

Depois de Woodstock, fui a muito mais festivais de rock do que posso me lembrar. A maioria deles mais cedo ou mais tarde acabava em lama. Alguns deles simplesmente pareceram longos concertos em uma sala de espera; outros tiveram a familiaridade reconfortante de um ritual, como o festival anual New Orleans Jazz and Heritage Festival (que foi realizado pela primeira vez na mesma época de Woodstock, tendo sua quadragésima edição este ano).

Poucos deles, como o Coachella e o Bonnaroo, lembram um set de um DJ experiente, transitando de forma organizada através de diversas bandas. E um punhado deles parece querer representar a declaração de uma geração: o primeiro Lollapalooza (em 1991), o Lilith Fair (em 1997) e, surpreendentemente, o Woodstock ’94 (realizado em Saugerties, estado de Nova York), que sobrepôs atrações do festival original com bandas mais contemporâneas, criando o que provavelmente foi o único mosh pit a saudar Crosby, Stills and Nash. Todos eles, porém, foram experiências de consumo: um pacote de entretenimento planejado, com músicas programadas e ambulantes convenientes.

O Woodstock foi diferente. Principalmente para um adolescente mais protegido o festival foi uma aventura: sujo, caótico, confuso, enlameado, incerto, com momentos de agonia e outros de puro êxtase. Mesmo que eu não usasse drogas, tive a sensação de que aquela multidão era muito mais do que uma mera plateia de um show, de que algo maior estivesse em jogo: de que o Woodstock iria provar algo ao mundo. O que ele provou – que pelo menos por um final de semana, hippies vivenciaram o que eles diziam sobre paz e amor – foi efêmero e inocente demais: aquilo não poderia confrontar a natureza humana quotidiana ou o funcionamento pragmático do mercado. Porém, quarenta anos depois, a sensação ainda persiste.

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